9/30/2014

VÍTIMAS DOS PRESÍDIOS

Autor: Francisco Toloza
“Tudo que existe merece perecer”. Federico Engels

Sem dúvida, todos que –como eu– conseguiram sair vivos e sensatos dessa máquina de destruição que é o sistema penitenciário, mantêm o imenso compromisso de lutar dia a dia pela liberdade dos milhares de homens e mulheres reduzidos na sua humanidade pela insânia do regime jurídico colombiano vigente.

Eu estava em dívida com meus companheiros retidos pelo Estado. Também é preciso agradecer a grande solidariedade nacional e internacional recebida, a qual –acima de tudo– sinto como um grito dos espíritos livres que acompanha aos prisioneiros políticos colombianos. Também é uma expressão de apoio à Marcha Patriótica como alternativa política para a transformação, e como um clamor para a autentica democratização de nosso país, o que implica o mais profundo e necessário redesenho do sistema judicial e penitenciário.

Seria muito difícil saudar individualmente a todas as organizações, partidos, coletivos e personalidades da Colômbia e do mundo que se posicionaram contra minha detenção e processo judicial –o qual continua a pesar de eu já estar em liberdade. Mas, sou muito grato a cada um deles, em meu nome e de todo o povo colombiano, que continua lutando pela tomada do poder, assim como em nome do conjunto da população carcerária submetida à ignominia irracional e cotidiana dos presídios e, especialmente, em nome de todos os presos políticos do país, cuja libertação continua a ser uma condição necessária para uma paz verdadeira, estável, duradoura e democrática na Colômbia.
Apresento para o debate público um primeiro texto sobre a situação geral dos presídios colombianos, sua profunda crise e necessidade da transformação estrutural, em que a demolidora frase de Engels toma um sentido pleno na medida em que mergulhamos nessa realidade, na qual não deveria restar pedra sobre pedra. Posteriormente virão outras notas sobre o problema particular da criminalização e os presos políticos, justamente quando o país discute a possibilidade de chegar ao fim do conflito.

A aguda crise do sistema penal e penitenciário colombiano


Duzentos anos de uma velha marca santanderista [legalista e burocrática] desembocaram na aguda crise do sistema judicial e carcerário nacional, reconhecida dos mais diversos ângulos. Por razoes políticas e econômicas, o Estado colombiano vem desenvolvendo um autêntico “populismo punitivo”, tal como é qualificado pelo mesmo vice-ministro da Justiça Miguel Samper. Por meio dele, pretende-se de forma falaz apresentar a criminalização e encarceramento como saída mágica para os problemas sociais e de segurança que a cidadania sofre. Nos últimos catorze anos foram apresentadas 37 reformas ao Código Penal para aumentar os castigos ou para criar novas figuras de delito, e ao mesmo tempo nenhuma para baixar as condenas ou para despenalizar condutas. Essa pletora de emendas não significou a uma diminuição da criminalidade nem uma maior segurança para o cidadão comum, como reconhecem as próprias autoridades estatais. A recente reforma ao Código Penal, Lei 1709 de 2014, embora vise reduzir a superlotação dos cárceres, torna-se um paliativo bastante ínfimo diante da crise estrutural do uso não racionalizado dos presídios parte do Estado colombiano. Mesmo assim, até agora não tem conseguido produzir os efeitos esperados.

Essa política criminosa liberticida, além da ampliação sistemática dos crimes e os castigos, se caracteriza pela apreensão até mesmo de pessoas que encontram-se na fase do processo judicial, mas sem ter sido julgada a responsabilidade em qualquer crime, o que faz com que hoje 30.8% dos reclusos que lotam os presídios sejam somente indiciados. São mais de 36 mil pessoas que pudendo se defender em liberdade aumentam a superlotação dos presídios colombianos sob a questionável figura da prisão preventiva, no meio à irresponsável estigmatização de “perigo para a sociedade” feita por fiscais, quem parecem trabalhar numa cadeia fordista de decretação de prisões preventivas. A obsessão dos legisladores e do judiciário pela prisão e tal que nem mesmo as condições excepcionais que deveriam paliar esse drama, conseguem mitigá-lo: os doentes graves experimentam uma versão penitenciária do chamado [literalmente] “passeio da morte” antes de ganhar a liberdade; enquanto que hoje em dia 155 crianças menores de 3 anos são prisioneiras junto com suas progenitoras, mais 100 mulheres são gestantes trás as grades e inúmeros menores tem sido arrancados das mães, tudo isso no meio a inexistência de uma regulamentação mais humana nesses casos.

O panorama é de superlotação: 117 mil presos –intramuros– para apenas 75 mil vagas, com uma superlotação nacional de 55, 6% (um excesso de mais de 40 mil reclusos), mas que em alguns presídios pode chegar até 400%. Esse gigantesco dado, somado aos mais de 30 mil presos em prisão domiciliar –extramuros–, torna a Colômbia num Estado carcerário e punitivo sem igual em América Latina. Pela quantidade de pessoas presas, a Colômbia ocupa o terceiro lugar na região –depois do Brasil e do México– e o 13° no mundo, enquanto que em termos de superlotação, ocupa o 8° lugar no mundo. De longe, a Colômbia é o país com maior número de prisioneiros por habitante em América Latina e basta lembrar que essa crise foi declarada faz já 16 anos, quando a mesma Corte Constitucional na sentença T-153/98, decretou a existência de um “estado de coisas inconstitucional” nos presídios colombianos devido à superlotação, que naquele momento era de 41%.

A superlotação somente traz mais penúrias aos encarcerados. 45% dos reclusos não tem acesso a qualquer atividade de ofício para descontar a pena. Os internos moram em menos de 3,4 metros quadrados definidos como mínimos pelo Comitê Internacional da Cruz Vermelha. As condições de salubridade são precárias, especialmente em presídios como La Tramacúa na cidade de Valledupar no norte da Colômbia em que o fornecimento de agua é insuficiente e é usado como mecanismo de controle dos presos, e as doenças epidêmicas coisa de todo dia nos pátios dos diferentes presídios. Enquanto isso, o atendimento à saúde entregue em concessão à EPS Caprecom, famosa pelo descaso e corrupção, continua tirando a vida –direta o indiretamente– dos presos que não recebem o atendimento adequado. Sem falar da evidente violação ao direito à intimidade nos pátios superlotados, em que são suprimidas as visitas conjugais e em que qualquer tipo de visitante é submetida a todo tipo de tratamento degradante. A mesma Corte Constitucional protegeu esse direito dos detentos na sentença T-815/13 a propósito da existência de apenas 20 locais “liberados” para a visita conjugal para os quase 5 mil detentos da prisão Picota em Bogotá. O mesmo acontece com as múltiplas sentenças sobre saúde, deslocamentos para hospitais ou até a liberdade foram até agora flagrantemente descumpridas pelas instituições carcerárias.   


Diante desses dados com certeza os defensores deste irracional modelo punitivo exigirão a construção de mais cárceres –embora que neste momento estão sendo construídos 9 novos presídios– e pedirão que mais recursos sejam repassados para o Instituto Nacional Penitenciário – INPEC, o que hoje representa um sangramento orçamentário que chega ao bilhão de pesos. Mas o problema é bem mais complexo e insustentável para o Estado colombiano: em um país com apenas 30 universidades públicas há 138 cárceres, dos quais 129 apresentam superlotação. Do ponto de vista econômico, dados do Ministério da Justiça afirmam que uma vaga numa prisão tem um custo para o país de 14 milhões de pesos por ano (aproximadamente 7 mil dólares), a mesma quantidade que é investida no mesmo período em 3,5 vagas nas universidades.

O crescimento da população carcerária é exponencial: enquanto no ano 200 havia aproximadamente 50 mil reclusos, hoje há aproximadamente 120 mil, ou seja, houve um aumento de 140% da população carcerária. Os 11 presídios construídos nesse mesmo período dobraram o número de vagas para reclusão de 38 mil para 76 mil, mas a superlotação subiu de 16% em 2001 para mais de 50% e o déficit de vagas passou de menos de 7 mil para mais de 40 mil. Por trás do populismo punitivo não apenas estão os interesses demagógicos de legisladores ociosos ignorantes da problemática penal e criminológica, nem somente o viés conservador que é próprio dos promotores das soluções de fato para os dramas sociais, mas um projeto em andamento na Colômbia de um autêntico complexo industrial penitenciário ou, como é bem definido pela lutadora norte-americana Angela Davis, um lucrativo empreendimento do castigo: macabra empresa do capitalismo em crise, que cria uma ampla massa “encarcerável” a partir da sistemática exclusão social, para logo incorporá-los ao mercado através do encarceramento maciço, o que implica grandes consumos e gigantescos lucros por parte dos consórcios penitenciários.

No ano 2000 no marco do Plano Colômbia, o Ministério da Justiça assinou o “Programa para o Melhoramento do Sistema Penitenciário Colombiano” com a embaixada dos Estados Unidos na cidade de Bogotá, por meio do qual USAIS e o Escritório Federal de Prisões dos Estados Unidos financiaram e assessoraram um projeto para a construção e/ou remodelação de até 16 presídios de segurança média e máxima. A implantação desse novo regime carcerário que pomposamente o INPEC chama de “Nova Cultura Penitenciaria”, não é outra coisa que uma cópia do fracassado, nefasto e perverso sistema de prisões norte-americano, o qual tem trás as grades a 1 de cada 30 cidadãos nos Estados Unidos: encarceramento maciço, esquemas de isolamento social, duras restrições e controles para os presos, privatização progressiva dos diferentes “serviços carcerários” e tratamento de guerra para os detidos, através da militarização dos presídios, além de transformações nos órgãos de custodia da prisão.

Para além do excessivo gasto em concreto nos “mega-presídios” encontram-se os meganegócios muito concretos das empreiteiras enquanto fornecedores dessas instituições. Com a massificação da prisão, crescem os contratos e se consolidam como um ramo da economia que lucra a partir da privação da liberdade dos seres humanos, empreendimento que se acentua com a proliferação das alianças público-privadas no nível dos presídios. Assim, engordam com as prisões as grandes empresas colombianas ligadas ao complexo militar industrial, ora de origem colombiano (empresas familiares, especialmente de ex-militares) ou autênticas transnacionais do setor que blindam suas ações na bolsa de valores com o número crescente de compatriotas privados de liberdade.

É claro que, como é típico de Macondo, o plágio sai pior do que o original. É copiado esquema restritivo, decalca-se a mercantilização das prisões e se imita até a arquitetura, mas omitem os princípios básicos desse mesmo regime penitenciário, ou seja, o mínimo vital ou a utilização plena do tempo do detento. Coloquialmente nos pátios dos presídios colombianos se diz: “É um modelo gringo (americano), mas sob administração do INPEC”. Instituição ignorante até de suas próprias norma, de ineficiência contumaz e carcomida por uma corrupção que chega a níveis de gangues. No interior dessa instituição opera uma autentica “Cosa Nostra” que vira perseguidora cotidiana dos detentos, advogados e visitantes que não aceitem estimular sua dinâmica mafiosa, mas que ao mesmo tempo chega até os níveis mais altos da administração do presídio. Só para exemplificar, durante o governo de Alvaro Uribe, na construção das 11 novas prisões e a remodelação de outras 19 houve um superfaturamento de mais de 1 bilhao de pesos; ou seja, 27 vezes o orçamento inicial, segundo a Contraloria General de la Nación. Também, como esquecer que a diretora da infame prisão de Valledupar, Emilda Vásquez Oñate, foi presa por tentativa de homicídio contra o chefe de vigilância desse mesmo presídio, no meio a uma vendeta entre máfias e funcionários.  
      
Este mar de ignominias –que se pretende coroar importando prisioneiros da base norte-americana de Guantánamo– é o que o establishment oferece como “opção de paz” para os interlocutores na Mesa da Havana, em sua obsessiva insistência, mas errada, em identificar as masmorras como conjuro infalível a todos os problemas nacionais, quando por via de tribunos editoriais exige cárcere para os subversivos com os quais atualmente dialoga, contrariando todas as experiências de acordos internacionais a esse respeito.

Por um movimento nacional carcerário

Os presos colombianos não perdemos a cidadania nem qualquer outro de direitos. Somos sujeitos sociais e políticos, parte do povo soberano e do poder constituinte. Portanto a degradante situação sofrida pela população carcerária obriga à participação direta na busca de soluções. Os reclusos, os processados, nossas famílias, nossos defensores, as organizações solidarias e até mesmo os trabalhadores do INPEC, devemos ser atores dessa necessária transformação do regime penal e penitenciário nacional, junto a outras vozes autorizadas como as faculdades de Direito das universidades do país e os centros de pensamento, em torno a esses temas tanto no nível nacional quanto no internacional, incluindo a interessante corrente abolicionista que abre-se passo no nível global.

Na base há dois aspectos iniludíveis para repensar a prisão: a causa e o fim desta. A causalidade estrutural da crescente criminalidade não pode ser lida como malignidade congênita, mas como produto da grave crise social e política que precisa grandes mudanças em todos os âmbitos, longe da formula unidimensional do presídio como saída para todos nossos problemas. A população carcerária é principalmente um setor do povo colombiano que é mais vítima do que vitimaria: antes que a formalidade legal nos declarasse “perigo para sociedade”, a sociedade previamente havia sido um perigo real e efetivo para nós.

Em segundo lugar, ninguém deve esquecer que as penitenciarias não podem ser vistas como depósitos sempiternos de homens e mulheres dissonantes com as normatividades sociais impostas, mas que devem formar parte de um sistema integral de ressocialização. Hoje ninguém pensa que os presídios colombianos sejam um instrumento certo para corrigir o crime, mas ao contrário um caldo de cultivo infinito para o crescimento delitivo. Impera a noção judeu-cristã do castigo antes que a racionalidade da projeção de homens e mulheres novas que perderam momentaneamente sua liberdade, mas que não devem por isso perder sua dignidade nem seus direitos. Nesse sentido, mantêm-se esquemas disciplinares caducos e irracionais nos que diz respeito a comunicação, socialização, cultura, horários, etc., verdadeiras regras de panópticos do século XIX em meio a fragilidade absoluta de projetos educativos e de emprego, ultrapassados pela incontrolada superpopulação, chocando plenamente com a autentica possibilidade de reinserção social.

Essas realidades e esse marco de análise, unem por iguais aos presos sociais e políticos colombianos cujas reivindicações básicas devem começar a ser ecoadas para além das grades, como propõe o Movimento Nacional Carcerário: Solução estrutural ao problema de superlotação por meio de reformas ao Código Penal; adequação de infraestrutura levando em conta a atual população carcerária; alimentação de qualidade, equilibrada e respeitosa das distintas dietas especiais; regime especial de saúde e eficiente oferta de serviço médico; garantias de comunicação; rejeição das transferências que afastam as famílias; contra a tortura, o isolamento e outras formas de repressão contra os detentos; pelo acesso à cultura, a recreação e o esporte; outorga efetiva aos processados não condenados e benefícios administrativos a todos os presos; vigilância por parte da população carcerária sobre a administração da prisão e a necessária mesa de diálogo entre o Ministério da Justiça e os presos. Esses são hoje os aspectos mais necessários e urgentes.

Um regime legal e judicial ilegítimo que devemos mudar

As proeminentes mazelas apresentadas aqui são apenas a ponta do iceberg de uma crise ainda maior: da justiça, das leis e, portanto, do mesmo Estado colombiano. A crise legal e judicial deriva de uma profunda crise política que se expressa no deplorável panorama penitenciário. 

Não podem ser legítimas as condenas quando o exercício da justiça na Colômbia é ultrajado pela cooptação por parte de máfias legais e ilegais, interesses clientelistas e do bloque de poder. É bem conhecida a crítica ao sistema judicial por ter transformado o sistema de contrapesos institucionais num verdadeiro carrossel da clientela política para benefício de todas as quadrilhas que espoliam todas as instâncias do poder público. Além da escandalosa politização de instituições como a Fiscalía, desde a época do fiscal Luis Camilo Osorio e a Procuraduría sob o comando de Alejandro Ordóñez, quem atuaram e continuar a atuar como como inquisidores por meio do macarthismo contra os presos políticos no país. Estes também exercerem sua função para benefício da mídia que anima o errado populismo punitivo. Existe, menos ainda, a chamada imparcialidade judicial na medida em que as forças armadas e especialmente a Polícia Nacional –sob controle indireto da intervenção militar norte-americana na Colômbia– são criadores de “evidencias” contra os contraditores políticos. Basta lembrar o rol desempenhado pelo órgão de polícia política –DAS– que hoje é exercido pela SIJIN, ou também quando os principais criminosos do establishment são protegidos juridicamente por inúmeros privilégios, aos quais não tem acesso os processados que são cidadãos comuns.

A cessão de soberania jurídica por parte do Estado colombiano por meio da figura de extradição de nacionais e outros acordos de subordinação política, limita efetivamente o exercício de aplicar a justiça. Ao mesmo tempo, a corrupção e o clientelismo das altas cortes, que tem sido inocultável nos anos recentes, evidenciam a ausência de meritocracia e controle popular nessa esfera, assim como dificuldades de organização institucional e uma crescente infiltração de empresas criminais em todos os níveis. Paradoxalmente, aos processados que estão fora dessa cumplicidade com os poderes fáticos são exortados a confiar numa salomônica administração de justiça desse aparato decadente, rendido aos interesses imperiais e cuja legitimidade hoje é questionada até por setores do mesmo establishment.  

Também pretendem nos inculcar a fé na lei, procurando que esqueçamos a origem desta: o desprestigiado poder legislativo. O pode resultar de um Congresso de famílias e pessoas como os Name, Ñoños, Gerleins, Obdulios, Palomas e Uribes? Qual é a legitimidade de uma legislação criada por um parlamento eleito por menos do 40% da população? Sem dúvida, estamos diante de um poder legislativo que não representa os interesses das maiorias, que não é o Congresso de paz, nem da transformação do regime penal e carcerário colombiano e que –muito pelo contrário– cria mecanismos para que o sistema do qual tiram proveito continue intacto.

São espúrios esses órgãos públicos que tem criado e perpetuado o atual estado de coisas, inclusive a continua e aguda crise carcerária. A solução real para nossos problemas não virá desse poder constituído, mas de sua transformação pelo povo soberano enquanto poder constituinte. A Colômbia precisa de uma nova política criminal e carcerária que seja digna, assim como também um poder judicial renovado e legítimo, ambos pensados com objetivo de alcançar um país em paz. Os colombianos precisamos nos reinventar enquanto nação, refazer o Estado e os poderes públicos. O cenário mais adequado para isso não são os já gastos mecanismos institucionais atuais, mas um espaço democrático e participativo para os cidadãos por excelência; ou seja, uma Assembleia Nacional Constituinte que quebre de vez com as barreiras físicas e históricas que nos oprimem. Enfim, precisamos uma nova carta magna para a paz e a liberdade.

Companheiros vítimas do poder judicial, vítimas dos presídios: Nos veremos na Assembleia Nacional Constituinte!




9/17/2014

O crime do deslocamento forçado

Disponível em: http://www.brasildefato.com.br/node/29791

Marcha Patriótica
Em entrevista, Olga Betancourd discorre sobre o trabalho desenvolvido pela Associação Nacional de Deslocados Colombianos (Andescol) diante de um conflito que já dura 60 anos
10/09/2014
Na Colômbia, há mais de 60 anos se produz um confronto armado que se as­semelha a uma guerra civil entre o Esta­do colombiano, as guerrilhas e os grupos paramilitares.
Comunidades camponesas, indígenas e afrodescendentes originárias das dife­rentes regiões da Colômbia acabam fi­cando no meio deste constante confron­to armado.
A partir do acirramento na intensida­de da guerra no país, essas comunidades têm sido forçadas a sair de seus territó­rios ancestrais como única forma de sal­var suas vidas.
Tais comunidades, em sua grande maioria rurais, acabam se deslocando forçosamente para a periferia das princi­pais cidades do país, ficando em condi­ções de extrema pobreza e tendo que en­frentar as outras violências próprias das cidades (desemprego, exclusão, margi­nalização).
Olga Betancourd é uma das líderes de uma das organizações mais representati­vas do deslocamento forçado da Colôm­bia, a Associação Nacional de Deslocados Colombianos (Andescol). Na entrevista a seguir, ela relata o trabalho desenvolvido pela associação
Brasil de Fato – Qual a importância da Andescol no contexto atual da Colômbia?
Olga Betancourd – A Andescol é uma organização de vítimas de deslocamento forçado que tivemos que fugir em direção às principais cidades da Colômbia por causa da guerra. Temos uma história de luta e de resistência de 15 anos pelo re­conhecimento dos nossos direitos funda­mentais violentados, principalmente, o direito à vida e ao morar nos nossos ter­ritórios. O objetivo da nossa organização é o de dar visibilidade ao descolamento forçado, reconhecido legalmente como um crime que atenta contra a humani­dade, por meio de ações políticas de re­sistência tanto no interior do país quan­to aquelas realizadas por aqueles que ti­veram que sair do país em condição de exilados ou refugiados. Temos também o objetivo de incidir no cenário político do país, para que o Estado solucione es­ta grave crise humanitária que atinge na atualidade 10% da população colombia­na, seja por meio de políticas públicas efetivas que atendam as vítimas do des­locamento forçado ou pela solução defi­nitiva do conflito social e armado no ter­ritório nacional.
Qual é a leitura da Andescol sobre o processo de negociação da paz entre o Estado colombiano e as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia)?
As palavras do representante do go­verno no início do processo de paz fo­ram: “Nem o modelo econômico, nem a doutrina militar, nem a inversão estran­geira estão em discussão no processo de paz em Havana”. E são precisamente es­tes três pontos, os que, a nosso ver, atra­vessam a problemática atual do descola­mento forçado na Colômbia. Existem vá­rios fatores em nosso país que geram o deslocamento forçado. O primeiro tem a ver com a política nacional armamentista e os planos estratégicos de guerra, como é o caso do Plano Patriota. O segundo, a presença e consolidação no território na­cional dos exércitos ilegais nomeados pa­ramilitares, que têm sido encarregados, com o apoio financeiro e militar de vários representantes do Estado assim como de empresários e investidores, de fazer “aquelas tarefas” que não podia fazer le­galmente o Exército colombiano. Todos esses interesses e alianças diretas, justifi­cadas com a desculpa de retirar o supos­to apoio “das comunidades” às insurgên­cias, têm gerado, além do deslocamento forçado, milhões de assassinatos e mas­sacres às comunidades que nasceram na maioria dos territórios rurais da Colôm­bia. Todos esses interesses e alianças não vão acabar com a assinatura de um acor­do de paz, porém, a não presença da in­surgência como organização clandestina no território nacional obrigará o Estado a responder ao povo colombiano pelos cri­mes de “lesa-humanidade”, que não que­rem reconhecer até hoje.
Há ocorrido algum avanço real desde que o novo governo tomou posse?
Com o atual governo, deu-se a Lei de Vítimas e a restituição das primeiras ter­ras apropriadas a partir de deslocamen­to forçado. Este é um importante passo para a reivindicação das vítimas deslo­cadas forçosamente, porém na sua exe­cução foram assassinadas 62 pessoas que exigiam suas terras. É com fatos co­mo este que queremos dar visibilidade, mais uma vez, ao fato de que não é ape­nas uma questão de acabar somente com a insurgência, já que muitas das condi­ções nas quais nos encontramos na atua­lidade são de responsabilidade tanto pela ação quanto pela omissão do Estado co­lombiano.
Os membros da Andescol sofrem algum tipo de ameaça?
Por conta de nossas reivindicações, apesar de nossa luta ser justa e neces­sária, temos sido objeto de perseguição política, de assassinatos e de julgamen­tos de vários companheiros da organiza­ção. Esses crimes contra nós são sempre justificados institucionalmente pela luta do Estado contra o narcotráfico e o ter­rorismo, só que a grande maioria das ví­timas tem sido as povoações originárias dos territórios rurais na Colômbia.
Quais são as propostas de Andescol quanto à construção de um espaço de unidade entre as vítimas de deslocamento forçado na Colômbia?
No contexto político de hoje, achamos que nossa proposta organizativa conti­nua sendo importante para a luta das ví­timas do deslocamento forçado em geral, já que o número de pessoas atingidas di­retamente pelo conflito político, social e armado corresponde aproximadamen­te a 6 milhões de pessoas. Neste sentido, a Andescol mantém como pauta perma­nente a luta pela paz com justiça social – um sonho para todos os colombianos, ainda mais para nós vítimas do desloca­mento forçado. Por isso oferecemos um apoio irrestrito aos diálogos de paz em Habana ao mesmo tempo em que exi­gimos o cessar-fogo porque o confronto armado continua gerando mais vítimas diariamente.
Também temos como bandeira de lu­ta o retorno aos nossos territórios de ori­gem, com dignidade e garantias, ao passo que sejam respeitados os nossos direitos fundamentais, econômicos e sociais es­tipulados na Constituição: direitos bási­cos como saúde, educação, soberania ali­mentar e soberania para nos mobilizar li­vremente pelo território nacional.
O que vocês entendem especificamente por “paz com justiça social”?
A paz com justiça social tem que re­solver as problemáticas socioeconômi­cas dos cidadãos, isto é, tem a ver com a possibilidade de comunicar todas as regiões do país, de ter as máquinas ne­cessárias tanto para a produção agríco­la quanto para a transformação de ma­térias-primas, de ter a possibilidade re­al de gerar empresas nacionais dirigidas pelas mesmas comunidades. Esta ques­tão é colocada porque, por estarmos há muito tempo fora dos nossos territórios de origem, não tem sido possível estudar e, portanto, nos qualificar nas cidades. Como camponeses, achamos ser possível viver dignamente no campo, de produ­zir em larga escala alimentos orgânicos a partir das comunidades e, além disso, re­construir nossas relações familiares, or­ganizativas e sociais.
O que fazer para que o conflito, uma vez resolvido, não volte a acontecer?
Acreditamos que o retorno para nos­sas terras deve trazer consigo a possibi­lidade de avançar em relação à verdade, à justiça e à reparação a partir dos nos­sos próprios relatos sobre os aconteci­mentos. É muito importante poder es­crever a memória histórica do desloca­mento forçado a partir de uma pesqui­sa total e aprofundada, a partir do relato da maioria das vítimas. Nesse sentido, a Andescol se soma à proposta de criar uma comissão que estude a origem do conflito armado no país para que a ver­dade possa sair à luz e estes crimes não se repitam nunca mais na Colômbia. É por isso que a Andescol também incen­tiva a realização de uma Assembleia Na­cional Constituinte, como um exercício de poder político a ser exercido pelos co­lombianos e colombianas na construção de um país com justiça social. É esta a nossa bandeira de unidade de luta a par­tir de nossa situação de vítimas de des­locamento forçado. Essa assembleia po­deria legitimar a defesa pela soberania nacional, isto é, a soberania alimentar, a nacionalização dos nossos recursos na­turais e a reestruturação de todas as ins­tituições do Estado. Só assim, podería­mos avançar na transformação das polí­ticas econômicas, políticas e sociais que respondam positivamente a questões vi­tais e que têm relação direta com o de­senvolvimento geral do país e a qualida­de de vida dos seus cidadãos. Em muitas ocasiões, tem sido possível conferir, por meio de pesquisas judiciais, o alto grau de corrupção, clientelismo, paramilita­rismo e narcotráfico de vários represen­tantes políticos do Estado colombiano, práticas que são muito negativas para o desenvolvimento econômico, político e social do país. Nesse sentido, mante­mos o anseio infinito na procura de uma paz com justiça social na Colômbia. Os deslocados forçados fazemos parte de uma mesma classe, uma mesma histó­ria, uma mesma pátria. Somos tradição de luta, exemplo fidedigno de resistên­cia por um mesmo sonho: uma Colôm­bia livre, digna e soberana.

9/07/2014

MARCHA PATRIÓTICA RECEBE A MEDALHA ABREU LIMA


A quarta feira 3 de setembro a Marcha Patriótica recebeu a Medalha Abreu e Lima junto a outras 4 pessoas-organizações reconhecidas pela luta solidaria e articuladora dos povos da América Latina; os outros homenageados foram Cecilia Maria Bouças do Grupo Tortura Nunca Mais; Leandro Konder reconhecido intelectual marxista; Antônio Duarte dos Santos marinheiro revolucionário do Brasil; e o Movimento Zapatista que continua enfrentando o Neoliberalismo.




A homenagem foi feita pela Casa da América Latina no marco do seu 7 aniversario, e foi realizada na Câmara dos Vereadores do Rio de Janeiro com a parecença de diversas organizações democrática, progressistas e revolucionarias.



As pessoas e organizações que receberam a medalha Abreu e Lima lembraram o contexto adverso pelo qual têm passado, e ainda passam, a maioria dos povos da América Latina, e que exige o fortalecimento do sentimento internacionalista e solidário daqueles que lutam contra o domínio do capital e do imperialismo.


A Casa da América Latina, os homenageados e os participantes lembraram a luta revolucionaria do General José Inácio de Abreu e Lima que, juntando-se às tropas de Simon Bolívar abriram os caminhos para a primeira independência dos povos latino-americanos. Também reconheceram que o sonho bolivariano da independência e unidade da América Latina tem que continuar sendo uma das principais bandeiras que levem os nossos povos à emancipação.